Denize Dodero é a primeira mulher a assumir a direção do Foro de Campo Grande

Prestes a completar 110 anos de sua instalação (12/05/1911), a Comarca de Campo Grande passou a contar, pela primeira vez, com uma mulher no seu comando. O marco histórico foi oficializado no Diário da Justiça n. 4654 de segunda-feira (25), com a nomeação da juíza de Direito Denize de Barros Dodero, da 1ª Vara Bancária da Capital, para exercer a função de juíza diretora do Foro da Comarca de Campo Grande, em substituição ao juiz Flávio Saad Peron.

Denize de Barros Dodero será a 31ª pessoa a ocupar o posto desde a instalação do Estado de Mato Grosso do Sul, em 1979. Antes dela, outros 30 magistrados foram empossados na função de juiz diretor, alguns deles por dois anos, até três anos consecutivos, ou até mesmo por duas ocasiões, mas, em todas as vezes, o que se tinha em comum era o fato de que nenhuma destas gestões foi comandada por uma mulher. Isto sem mencionar três magistrados que ocuparam durante os anos de 1980, 1981 e 1982 o posto de juiz diretor do Foro Criminal, paralelamente ao Foro Cível.

A notícia da nomeação da juíza Denize repercutiu nas redes sociais, onde diversos colegas, amigos e familiares a parabenizaram pela conquista: como o colega de trabalho, juiz Carlos Alberto Garcete de Almeida, titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, função, aliás, ocupada pela juíza quando do afastamento do magistrado para conclusão de seu pós-doutorado. Durante o período, a magistrada conduziu, com pulso firme, um dos casos de maior repercussão social na cidade, o júri popular de um Policial Rodoviário Federal acusado de assassinar um empresário após discussão no trânsito. A sessão de julgamento ocorreu no dia 30 de maio de 2019.

Em sua felicitação na rede social, Garcete sustentou a certeza de que ela será “um sucesso” ocupando a direção do Foro. Já o amigo Carlos Alberto Coimbra, ex-diretor do Hospital de Câncer Alfredo Abrão e ex-Secretário de Saúde, exclamou: “Você só nos dá orgulho! Mulher guerreira, magistrada exemplar! Parabéns ao amigo desembargador Carlos Eduardo Contar pela escolha!”.

A colega e amiga Paula Volpe, promotora de justiça, parabenizou dizendo: “Com sua competência indiscutível, seu coração imenso e sua dedicação gigante você fará história! Sempre nos orgulhando! Estamos aqui, aplaudindo e apoiando!”.

Muitas outras mensagens congratularam também o recém-empossado presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Des. Carlos Eduardo Contar, pela escolha acertada e merecida de uma mulher para ocupar este cargo na maior comarca do Estado.

“Quando alguma de nós rompe a barreira do ‘nunca houve uma mulher’ e passa a ser a ‘primeira mulher’, todas nós celebramos e vencemos”, foi outra mensagem de carinho da amiga advogada Silmara Amarilla.

Estarão sob os cuidados da juíza um quadro funcional de 621 pessoas, sendo 50 magistrados, 300 servidores, além de 90 estagiários, 93 mirins, 79 terceirizados, 5 reeducandas e 4 colaboradores por meio de convênio com a Associação Pestalozzi.

A nova diretora do Foro de Campo Grande falou um pouco sobre esta conquista profissional. Acompanhe abaixo a entrevista concedida à Secretaria de Comunicação do TJMS:

– Em tempos em que a mulher avança nos cargos de comando em diversos setores, como também no Judiciário, como a Sra. recebe esta notícia de se tornar a 1ª mulher diretora do Foro da Comarca de Campo Grande?

Recebo minha designação com enorme gratidão e muita esperança na gestão do nosso presidente, desembargador Carlos Eduardo Contar. Uma escolha desvinculada de gênero, mas pautada na igualdade de oportunidades. Uma administração voltada à valorização de habilidades e competências, baseada em meritocracia e fundadora de um contraponto a uma tradição de 110 anos de transcendência exclusivamente masculina na direção do Foro em nossa comarca de Campo Grande. É uma conquista coletiva, que em muito ultrapassa minha individualidade. Tenho ciência de que essa oportunidade é fruto de muitas em mim. E que seja motivo de inspiração e realização de infinitas possibilidades para as mulheres, notadamente de carreiras jurídicas. Uma honra assumir essa função em representatividade de todas as juízas de nosso Estado. Orgulho e agradecimento imenso pela confiança.

– Em uma sociedade na qual a desigualdade de gênero ainda é tão presente, qual a conduta que a Sra. adota para valer os seus direitos de igual para igual com os seus pares magistrados?

Acredito no poder da representatividade e em uma sororidade muito além da teoria. Há também necessidade constante de qualificação e educação em novas habilidades, aprimoramento e desenvolvimento da comunicação, inteligência emocional e, principalmente, capacitação em liderança.

– Numa sociedade ainda muito patriarcal, como a Sra. analisa o machismo na sua profissão, ainda predominantemente ocupada por homens?

As relações de trabalho não criam, apenas reproduzem nossas relações sociais. O machismo presente no exercício de nossas funções é o mesmo que permeia nosso ambiente social e familiar. Somente pela educação, reflexão e diálogo é possível reconhecer e desconstruir esse fenômeno. São muitos anos de identidades pressupostas e culturalmente limitadas, estereótipos impregnados no inconsciente coletivo. A conscientização de que a dinâmica nas relações sociais envolve muito além da identidade biológica, mas uma totalidade de intelectos, emoções, valores e individualidades, reflete em todas as nossas relações, inclusive de trabalho, com a atual tendência de preponderância do humano em contraste ao masculino ou feminino.

– O que podemos esperar de sua gestão? Quais são seus principais planos e objetivos?

Meu ideal de gestão reside na adoção de medidas para maior produtividade e qualidade do serviço judiciário, aprimoramento da comunicação, treinamento de competências, parcerias entre instituições, gestão de emoções e pessoas, qualificação em lideranças e estabelecimento de meritocracia, em total sintonia e harmonia com o plano maior de gestão da atual Administração do TJMS para o biênio 2021/2022.

– Com relação à sua conduta enquanto gestora, o que juízes, servidores, advogados, membros do Ministério Público, Defensoria Pública, etc. podem esperar de seu trato no dia a dia?

Tenho o propósito de trabalhar em prol da elevação e dignificação da minha instituição. Quero tratar a todos com urbanidade e humanidade. Farei o possível para estabelecer vínculos de confiança e segurança, pautados em respeito, igualdade e senso de justiça, com o objetivo de alcançar união e bom ânimo, bem como, disciplina, responsabilidade e excelência no desenvolvimento das atribuições judiciárias.

– Qual a mensagem a Sra. deixaria a outras mulheres, mães e tantas outras multifunções que  acreditam ser muito difícil conciliar uma carreira de sucesso com uma vida pessoal feliz e realizada?

É mesmo difícil. Estou muito distante do ideal de perfeição que persiste no imaginário coletivo. Sou uma pessoa simples no exercício de uma função social e profissional muito relevante, nem por isso menos desafiadora. Esse equilíbrio entre minha vida profissional e pessoal nunca foi estático e é permeado por inúmeras renúncias, muitas vezes com comprometimento de saúde física, mental, emocional e espiritual. Mas além do ordinário, há sonhos e ideais, há resiliência e uma força interna para ir além, conquistar espaços, vencer desafios. Uma vontade de alma de uma vida com mais significado. O profundo desejo de colaborar, somar, construir. De deixar um legado e viver um propósito. Essa lealdade aos nossos princípios, a essência de quem somos, de nossos valores e a fé na possibilidade do justo são motivações realmente irrenunciáveis. Então, minha mensagem é: Não desistam. E, se preciso, recomecem. Sempre!