Nova lei das Falências vai agilizar processos de recuperação judicial

O Senado aprovou no fim do mês passado o Projeto de Lei 4.458/2020, a nova Lei de Recuperação Judicial e Falências.

Segundo especialistas, caso a proposta seja sancionada vai agilizar processos e evitar que empresas fechem as portas e decretem falência.

Entre as mudanças, o projeto amplia o financiamento a empresas em recuperação judicial, permite o parcelamento e o desconto para pagamento de dívidas tributárias e possibilita aos credores apresentar plano de recuperação da empresa.

A equipe econômica do governo federal passou a apontar a proposta como prioritária para auxiliar na saída da crise causada pela Covid-19.

De acordo com o advogado especialista em direito tributário e empresarial Evaldo Mesquita, caso a proposta seja sancionada, a lei terá mais efetividade.

“A lei em vigor na prática não cumpria os objetivos dela, tornou-se uma mecanismo ineficiente, porque os processos não terminam e existem muitos entraves. Na prática, a empresa que entra com processo de recuperação judicial não consegue se reerguer e os credores que têm alguma coisa para receber também não conseguem receber”, explica e completa.

“Se o judiciário der efetividade a lei vai agilizar muito. Os entraves tornavam o processo muito longo. A expectativa é de que a mudança ajude na recuperação econômica do País. Hoje, grandes grupos econômicos entram em recuperação, isso gera desconfiança na empresa, ela não consegue acesso à linha de crédito, vender ativos e caminha para a falência”, considera Mesquita.

O projeto prevê que as empresas em recuperação judicial tenham condições melhores para negociar débitos com a União, com parcelamento em até 120 meses, ou seja, 10 anos. Hoje, o prazo máximo é de sete anos.

Segundo o advogado Carlos Henrique Santana são vários os pontos que merecem atenção.

“Com as dívidas com a União, o projeto prevê parcelamento de até 10 anos dos créditos inscritos em dívida ativa, com descontos que podem chegar a 70% do valor do débito. Novos empréstimos que entrarem no caixa da empresa, regras para mediação, o tratamento para os casos de empresas com ativos e credores no exterior, facilitar que, mesmo com a falência, tenham condições de retomar novos negócios ou transferirem de forma mais ágil as dívidas para terceiros”, analisa Santana.

Financiamentos

O projeto também regulamenta empréstimo para devedor em fase de recuperação judicial. De acordo com a proposta, novos financiamentos terão preferência de pagamento entre os créditos contraídos durante o processo.

A medida pode dar mais segurança a bancos na hora de dar crédito a empresas em dificuldade financeira.

A intenção é de que com a nova lei os processos travados sejam destravados.

“Hoje, quem empresta dinheiro para empresa em recuperação judicial tem direito a receber com prioridade na fila, só que não é uma prioridade alta. Resultado prático disso: ninguém quer emprestar dinheiro para empresa em recuperação judicial. Com a nova lei, existe um fomento à concessão de crédito às empresas, com uma regra de segurança que garante uma superprioridade em caso de falência. A ideia é fomentar a concessão de crédito”, comenta Mesquita Júnior.

Outra mudança que pode facilitar a negociação é que os credores poderão propor um plano de recuperação.

“Na lei atual, as condições de pagamento funcionam assim: só o devedor é que propõe as condições de negociação por meio do administrador da recuperação judicial e os credores podem aceitar ou não. Se não aceitam correm até o risco do processo ser trocado de recuperação judicial para falência. Com as alterações, os credores também poderão propor um plano de recuperação”, explica Mesquita Júnior.

O advogado ainda analisa que a venda de ativos da empresa se tornará mais atraente.

“Atualmente, existe a possibilidade de vender ativos da empresa em recuperação. Mas quem adquire ativos corre o risco de responder pelas dívidas, o que diminui o interesse das aquisições. Com a nova lei, ficou claro que a alienação de ativos não enseja a sucessão de dívidas pelos adquirentes, os credores do vendedor devem ser pagos e o interesse dessa modificação é proporcionar a venda por um valor justo. Ou seja, o interessado poderá comprar o ativo e estará livre de dívidas”, completou.

O projeto permite ainda que dívidas trabalhistas sejam incluídas nos processos de recuperação extrajudicial, desde que haja aprovação pelo sindicato da categoria.

Além disso, o produtor rural pessoa física, aquele que não tem CNPJ, também poderá entrar com um pedido de recuperação judicial. Não há essa previsão na lei atual, apesar de haver autorização na Justiça em alguns casos.

Prazo

A legislação atual faz com que o processo de recuperação se arraste por anos. O objetivo da nova proposta é dar agilidade ao processo.

“Na lei de hoje, apesar de prever a suspensão das execuções contra a empresa que está em recuperação, com prazo de 180 dias, na prática, ela vai ter prorrogações indefinidas desse prazo, muitas vezes se arrastando por anos, forçando os credores a aceitarem condições perversas”, diz Mesquita.

Em caso de aprovação da nova lei, será admitida apenas uma prorrogação do prazo de 180 dias.

“E para isso o devedor vai precisar demonstrar que não deu causa ao atraso. Passando esse prazo, os credores estão autorizados a apresentarem seu próprio plano de recuperação e seguir o processo”, contextualiza o advogado.

Para Santana, o processo de recuperação judicial continua sendo um trabalho de grande complexidade.

“Principalmente pelo envolvimento de várias áreas do negócio e exigir um entendimento e relação com vários setores, como bancos, funcionários, tributos, fornecedores, etc. Mas a atualização de alguns mecanismos e a criação de novos pode viabilizar alguns instrumentos que são utilizados de forma mais evidente”, comenta e finaliza.

“Ela está evoluindo, a lei é de 2005, então com certeza essa modernização trará avanços para os negócios que precisarem desse apoio jurídico, no entanto, outras melhorias precisam vir para que ela se aperfeiçoe cada vez mais”, analisou Carlos Henrique Santana.

Empresas em recuperação no Estado

Em Mato Grosso do Sul, dois grandes grupos empresariais entraram em recuperação judicial nos últimos anos.

Em agosto do no passado, o grupo Bigolim (materiais para construção) conseguiu aval do recurso da defesa para oficializar plano de recuperação judicial do grupo. A empresa enfrentava uma crise financeira há três anos.

Com um montante de R$ 54,7 milhões em dívidas, a Bigolin ingressou com pedido de recuperação judicial em março de 2016.

Segundo nota divulgada pela rede na época, o processo de recuperação tinha como objetivo ajudar a superar “a crise econômico-financeira da empresa, para garantir a manutenção da sua capacidade produtiva, dos empregos e dos interesses dos credores, promovendo a sua preservação, a sua função social e o estímulo à atividade econômica”.

A empresa terá 15 anos para pagar R$ 29,6 milhões, após abatimento do valor total de R$ 59,6 milhões.

Outro caso emblemático no Estado é do Grupo Buainain, com a rede de drogarias São Bento.

Por temer a falência, o grupo ingressou com pedido de recuperação judicial, em 2015. O grupo chegou a ter mais de 90 farmácias no Estado.